Um amigo especial
Após meu café junto aos amigos da távola redonda, na panificadora Maykon, em outra oportunidade conto esssa história, voltando para casa encontrei um outro amigo. Vinha do outro lado da rua, passos lentos, mãos cruzadas às costas, tossindo um pouco, como ele mesmo diz, pelo pigarro do cigarro, cabeça arqueada para frente em direção ao solo. Atravessei o logradouro e ao cumprimentá-lo, o sorriso cativante e sincero de quem sorri com os olhos, espalhou-se pela rua. Ele voltava da caminhada diária que faz de sua casa até a orla, uns 800 metros; lá ele acende um ou dois cigarros e fica olhando o horizonte, contemplando as ondas acariciado pela brisa suave. Indaguei sobre a situação do mar, da visão belíssima a que somos presenteados todas as manhã durante todo o tempo, ao que ele me respondeu, está do mesmo jeito! E de volta com a vista para a imensidão azul à nossa frente, do ponto onde a foto desta crônica foi captada, disse a ele tratar-se de um lugar belo, acolhedor, tranquilo e incansável de se olhar. Ele, com o semblante menos convidativo, respondeu, já foi mais bonito. Questionei o porquê, arriscando alguns argumentos, tipo, aumento da população, mudança da mata ciliar, violência? Ele com olhar distante e extremamente constrito, quase marejado, pelos acontecimentos, respondeu com uma viradinha de cabeça e o cenho arqueado. Tem hoje perto de 70 anos, não sei ao certo, talvez menos, mas sua aparência denuncia bem mais idade. Isso tem um motivo, a solidão o convidou para companhia desde que a esposa faleceu, isso há mais ou menos uns cinco anos, os filhos moram em outras cidades. Vez por outra ele vai à Curitiba, onde mora um dos filhos, talvez todos morem por lá, é o que sei do que ele comenta às vezes. Pelo que ele próprio conta essa perda o deixou órfão, mais que isso, ficou descrente de tudo. Certa feita, narrou ele, bateram palmas em sua casa num domingo pela manhã, claro, a dupla de obreiros das Testemunhas de Jeová, um belo trabalho missionário, reconheçamos. Indo até o portão, parou uns metros antes e respondeu ao cumprimento e em seguida elas iniciaram a narrativa sobre a palavra e a revista do dia, ele pediu que não precisava continuar, pois não acredita em Deus. As obreiras ficaram mudas por um instante e disseram que Ele existe sim, é preciso acreditar. Mário disse de volta, então, faz o seguinte, vão andando por ai e se vocês encontrarem ele, tragam aqui para eu ver e ai eu digo se acredito. Voltando ao ponto em que falávamos da beleza do mar, os dias foram bonitos por que tinha a companhia da esposa, aqui eu vivi os melhores anos de minha vida, e estou vivendo os piores também. Fica evidente o reconhecimento e o amor pela companheira. Fica claro também que o amor, de fato, não tem idade, pode mudar de jeito, mas não de tamanho nem de importância.
LuizcomZ
Enviado por LuizcomZ em 16/05/2018
Alterado em 16/05/2018